Conheça quem bancou a ida de tratores no 7 de setembro em Brasília

 Por volta das 7h30, os tratores do agronegócio estacionados desde terça-feira no Ministério da Justiça começaram a se posicionar para entrar no desfile do Bicentenário da Independência, em Brasília. A postos nos veículos, os operadores vestiam a camisa do Movimento Brasil Verde e Amarelo, que trazia a palavra “liberdade” nas mangas, adotada frequentemente nos discursos golpistas de Jair Bolsonaro. Do outro lado da avenida, chegavam os blindados das Forças Armadas, que de forma inédita dividiram o protagonismo do desfile cívico militar.

Agência Pública identificou quem são os proprietários de 24 dos 28 veículos que participaram do evento. A lista contém nomes de grandes empresários de implementos e maquinários agrícolas, produtores rurais e representantes de sindicatos regionais do agro. Segundo relataram à reportagem, os donos investiram de R$ 4 mil a R$ 15 mil para garantir a presença de suas colheitadeiras e tratores no desfile, tornado um ato em apoio à campanha de reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL), como narrado ontem (7) pela Pública.

Entre as máquinas do agro que percorreram os 5 km entre a Esplanada dos Ministérios e o estádio Mané Garrincha, onde a comitiva se desfez, estava a do gaúcho João Antônio Franciosi. Dono do grupo Franciosi, que compra e vende latifúndios e cultiva algodão e soja em larga escala no oeste da Bahia, ele já esteve envolvido em um escândalo de grilagem e venda de sentenças naquela mesma região – episódio mais conhecido como operação Faroeste.

Fazendeiro com atuação histórica na principal fronteira da soja no Brasil, no Cerrado do Matopiba, Franciosi também já foi multado em R$1,6 milhão por desmatamento ilegal pelo Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis), como mostra um levantamento do observatório De Olho nos Ruralistas. O ruralista destacou dois de seus funcionários do município de Luís Eduardo Magalhães (BA) para pilotarem seu trator no desfile do Bicentenário da Independência.

Um dos fundadores do Movimento Brasil Verde e Amarelo, o produtor rural Júlio Nunes, afirmou à reportagem que a participação oficial do agro no Bicentenário foi articulada diretamente com as Forças Armadas.

Pública apurou com outros envolvidos na organização que também ocorreram reuniões com o mesmo intuito na Secretaria de Comunicação Social, comandada pelo ministro Fábio Faria (PP). Tudo isso após o pacto com o presidente da República. De acordo com Nunes, foram os produtores que pediram a Bolsonaro para integrar a comemoração.

O movimento Brasil Verde e Amarelo é fiel ao mandatário desde o início de seu governo e esteve à frente de manifestações pelo voto impresso e contra o Supremo Tribunal Federal (STF) ao longo dos últimos anos. Eles ainda organizaram caravanas para levar pessoas ao Bicentenário da Independência e financiaram o carro de som utilizado como palanque para a campanha de Jair Bolsonaro após o desfile.

O principal líder do movimento é o presidente licenciado da Aprosoja (Associação Brasileira dos Produtores de Soja), Antônio Galvan, investigado por atos antidemocráticos pelo Supremo Tribunal Federal. Ele disputa uma vaga no Senado pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) de Roberto Jefferson, no Mato Grosso. Conforme mostrou a Pública em reportagem publicada ontem, o ruralista já obteve vantagens do governo Bolsonaro para produtores de soja.

Galvan negou envolvimento nas tratativas para viabilizar a ida dos tratores a Brasília, mas participou do evento de ontem, segundo ele, a convite do presidente.

Apesar de tudo isso, Júlio Nunes nega o cunho político do Brasil Verde e Amarelo. “Não é movimento político, nem partidário, nem militante, nós não somos da rua, somos da roça, gostamos de mostrar nosso patriotismo dessa forma”, afirmou em conversa com a reportagem dias antes do desfile.

Fato é que os donos das máquinas agrícolas que passaram ontem pela Esplanada dos Ministérios são apoiadores do presidente.

Quarto maior doador para a campanha de Bolsonaro até o fechamento deste texto, o diretor-presidente da Stara, Gilson Lari Trennepohl, pediu à concessionária Elo Fortes, de Formosa e Unaí, que enviasse dois tratores da marca para o desfile, segundo relataram os operadores das máquinas. Vice-prefeito de Não-Me-Toque (RS), Trennepohl (DEM) reuniu-se com Bolsonaro em sua cidade, em maio passado, conforme divulgado por uma rádio local – também ligada ao dono da Stara.

O agronegócio goiano fechado com Bolsonaro

“Em todos os outros governos nós nunca estivemos aqui para comemorar, sempre para reivindicar questão de juros, de dívidas e tal, e nesse governo, felizmente, já é a quarta vez que nós viemos aqui para comemorar, para participar dos eventos que têm em Brasília”, afirmou o produtor rural Vanderlei Secco, que usava um boné de apoio a Bolsonaro. Ele levou dois tratores de Rio Verde (GO) para a marcha, ao custo de R$ 15 mil, conforme contou. A Carpal, representante em Goiás da marca New Holland, do trator de Secco, aproveitou a vitrine do desfile para fazer marketing em suas redes sociais.

Distante em mais de 400 km da capital federal, Rio Verde é o 2º município mais rico do agronegócio no estado e está na lista dos dez mais ricos do país, segundo a Faeg (Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás). Cinco veículos que desfilaram vieram de lá.

Presidente do Sindicato Rural de Rio Verde, Luciano Jayme Guimarães
Presidente do Sindicato Rural de Rio Verde, Luciano Jayme Guimarães

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