Crise econômica prolongada expulsa jovens e mais velhos do mercado de trabalho
Silvia Cunha tem 53 anos e há quatro meses perdeu o emprego de editora de livros, com carteira assinada na empresa que trabalhava há seis anos. Ela e outros três profissionais com idades de 48, 52 e 63 anos, chamados de sênior, por terem mais experiência profissional, mas sem ocuparem cargos de chefia, ganhavam mais do que os mais jovens e, por isso foram desligados da editora em que trabalhavam.
Ao contrário de períodos com taxas de emprego em alta, empresas como a de Sílvia estão demitindo os seniores para trocá-los por trabalhadores com alguma experiência, mas com idade intermediária, que aceitam salários mais baixos porque a recolocação está difícil.
Em 2014, quando havia pleno emprego com a taxa de desemprego chegando a apenas 4,3%, havia forte contratação em todas as faixas etárias, lembra o ex-diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e atual assessor do Fórum das Centrais Sindicais, Clemente Ganz Lúcio.
“Os jovens, principalmente de escolas técnicas já saiam empregados e os aposentados eram convidados a retornar ao trabalho”, afirma Clemente.
No cenário atual, acontece oposto e o resultado é que, atualmente, o desemprego atinge 7,6 milhões- um a cada quatro – trabalhador de 14 a 29 anos; e 880 mil acima de 50 anos, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), compilados pela consultoria IDados, para o jornal O Estado de São Paulo.
O problema não é a empresa andar mal das pernas economicamente, como no caso da editora em que Sílvia trabalhava. Segundo ela, trabalho não falta, tanto que agora alguns de seus colegas estão sendo chamados para fazer freelance na mesma empresa que os demitiu. Silvia está fazendo o mesmo, mas em outra editora.
“Tenho 26 anos de experiência e assim como outros profissionais da minha faixa etária passamos por todas as mudanças tecnológicas, desde o fotolito, material impresso em gráfica, rotativas, PDF, enfim, a gente acompanhou e transita super bem, edita em plataforma, trabalha em home office, então esse não é o problema. O que percebo é a falta de vagas com carteira de trabalho assinada”, diz Silvia
A editora lamenta a perda de direitos como 13º salário, Fundo de Garantias por Tempo de Serviço (FGTS), férias, vales e a parte da contribuição para a aposentaria que a empresa fazia.
“O valor dos meus ‘frilas’, na maioria, corresponde a 80% do salário que eu ganhava, mas sem os direitos, os ganhos diminuem ainda mais. Além disso, com a reforma da Previdência, preciso esperar mais nove anos para me aposentar e a contribuição vai fazer falta até eu chegar aos 62 anos, idade mínima para receber”, conta Silvia.
A editora ainda consegue sobreviver de frilas, mas para os quase 8 milhões de trabalhadores jovens ou com mais de 50 anos sentem o peso da falta de trabalho. Nos últimos dez anos, o Brasil ganhou mais de 2,2 milhões de desempregados nessas faixas etárias.
A explicação para a atual situação, segundo Clemente Ganz Lúcio, é que o desemprego para os mais jovens e mais velhos se aprofunda em tempos de crise, pelo “excedente” de mão de obra disponível no mercado de trabalho.
Os jovens, prossegue o ex-diretor-técnico do Dieese, são mais impactados pela falta de trabalho por que são a mão de obra mais barata para ser demitida. Eles, normalmente, têm pouco tempo de casa, a indenização é menor e seus postos de trabalho não costumam ser a principal atividade da empresa.
Clemente diz ainda que é preciso considerar a dinâmica do mundo do trabalho, onde os jovens de 14 a 17 anos tendem a ter uma taxa maior de desemprego por estarem na escola. Os de 18 a 24 anos têm mais chances de emprego por estarem na transição escola-trabalho. Já os mais velhos são preteridos em função dos salários maiores e, por não aceitarem perdas de direitos facilmente.
“Se a taxa atual de desemprego fosse 5% seria natural que o índice de jovens sem trabalho fosse de 10% e não mais de 30% como é hoje, porque tem gente mais preparada procurando por uma vaga. Para piorar, nesse segmento o atual governo não tem uma política pública que ajude a transição escola-trabalho e os jovens ficam ao ‘Deus dará”, diz.
Entre 2003 e 2015, foram gerados mais de 22 milhões de postos formais de trabalho, e o Brasil atingiu o pleno emprego. Em 2010, quando o Brasil alcançou a situação de pleno emprego pela primeira vez, o tempo de espera por uma nova vaga era de 5 meses, em média. Hoje, a situação é muito diferente: o desemprego atinge quase 11 milhões de trabalhadores, e o tempo de procura por emprego ultrapassa os dois anos para mais de 26% deles.
“Quando a economia vai bem, essas faixas etárias, normalmente fora do mercado de trabalho, têm mais chances. Mas com a crise econômica, agravada pela pandemia, a tendência, se não houver uma mudança nos rumos da economia, e a taxa de desemprego se mantiver em alta, é que os jovens e os mais velhos, que antes eram convidados a retornar ao trabalho, sejam ainda mais prejudicados”, conclui Clemente.
Confira a evolução do desemprego de 2012 a 2021, por faixa etária publicada pelo Centro de Altos Estudos Brasil Século XI, a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD Contínua), do IBGE.
Fonte e Foto: Mundo Sindical
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