Ministro do TST defende fortalecimento de sindicato
Defensor da prevalência do negociado sobre o legislado, previsto na
reforma trabalhista de 2017, o curitibano Amaury Rodrigues Pinto Junior
assume o cargo de ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) com
olhar crítico. Pondera que só poderá haver legitimidade, nos acordos
entre empresas e trabalhadores, se for criado algum mecanismo para
fortalecer os sindicatos.
“Os sindicatos tiveram a sua capacidade econômica reduzida porque
ficaram sem fonte de sustento. Como eu vou ter uma capacidade negocial
se eu não tenho capacidade econômica?”, questiona o novo ministro, que
defende a modernização da legislação trabalhista.
Ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Mato Grosso do
Sul, Amaury Rodrigues assumiu o cargo ao lado de outro indicado pelo
governo de Jair Bolsonaro, o baiano Alberto Bastos Balazeiro, que era
procurador-geral do Trabalho.
O novo ministro sempre sonhou em ser juiz, antes mesmo de entrar na
faculdade. E como julgador defende uma “análise econômica do direito”,
ou seja, que juízes também considerem o impacto econômico de suas
decisões. “Se determinada decisão causar um desequilíbrio na relação
empregado-empregador, vai repercutir nas atitudes futuras de empregados e
empregadores”, diz ele, em entrevista ao Valor. A seguir os principais
trechos da conversa.
Valor: A existência da Justiça do Trabalho está ameaçada?
Amaury Rodrigues Pinto Junior: Não. A área trabalhista é absolutamente
necessária. A relação entre empregado e empregador nunca vai deixar de
existir. Algumas pessoas chegaram a cogitar a extinção da Justiça do
Trabalho, mas não pensaram direito nas consequências. As revoluções
resultam da opressão. O povo oprimido acaba se revoltando. Por mais que
você se sinta oprimido terá uma válvula de escape. Você vai ter a
Justiça do Trabalho como um canal em que pode fazer a reclamação,
apresentar a indignação e vai ter uma resposta. A Justiça do trabalho é
essencial para uma nação livre e democrática. Não vejo riscos.
Valor: A reforma trabalhista aprimorou as relações de trabalho ou gerou perdas aos empregados?
Amaury Rodrigues: As relações trabalhistas são sempre muito dinâmicas e
acompanham a evolução da sociedade e, por isso, a legislação
trabalhista precisa ser modernizada. A reforma trabalhista fez uma
modernização radical, muito grande. Teve muitos prós e contras também.
Há questões que precisam ser aprimoradas, mais trabalhadas, e novas
legislações precisam ser edificadas para viabilizar uma melhoria na
relação capital-trabalho. Mas também há importantes questões.
Valor: Quais?
Amaury Rodrigues: Uma questão interessante da reforma trabalhista é a
da sucumbência. Isso dá o contrapeso à possibilidade de formular
pretensões. Quando não há consequência nenhuma, você pede à vontade.
Então, os pedidos eram múltiplos, cada vez mais inchados. Muitas vezes
pedidos temerários eram formulados, porque o máximo que pode acontecer é
eu não ganhar o que estou pedindo. O que eu escutava do lado
empresarial como juiz era que, quando ganhavam a ação, mesmo assim
perdiam porque a empresa tinha que pagar os honorários com base no valor
da ação que estava na petição inicial. Hoje essa questão se tornou mais
adequada à nossa realidade. O advogado trabalhista vai pedir aquilo que
ele acha que tem chance de ganhar, senão vai perder na sucumbência.
Isso não reduziu a quantidade de ações trabalhistas, mas com certeza
reduziu a quantidade de pedidos na ação e os valores.
Valor: E o que ainda precisa ser aprimorado?
Amaury Rodrigues: A reforma estabeleceu a prevalência do negociado
sobre o legislado e atribuiu aos sindicatos um poder muito grande, uma
capacidade negocial muito grande. Teoricamente isso é excelente.
Negociar é sempre melhor do que legislar. Ao mesmo tempo, os sindicatos
tiveram a sua capacidade econômica reduzida porque ficaram sem fonte de
sustento. Como eu vou ter uma capacidade negocial se eu não tenho
capacidade econômica? Essa é uma dificuldade que eu vislumbro e é clara
na relação trabalhista. A hipossuficiência econômica do trabalhador faz
com que a sua vontade não seja tão livre quanto seria em relações
negociais equilibradas. Parece-me que, ao mesmo tempo que se estabelece o
fator negocial como prevalente, deveria se estabelecer mecanismos para
garantir aos trabalhadores em entidades coletivas, sindicais ou
representativas da categoria força para negociarem em igualdade de
condições com o setor empresarial. A negociação coletiva é tanto mais
legítima quanto mais o sindicato for representativo da sua categoria e
tiver condições de negociar de igual para igual.
Valor: A reforma pode ajudar nesse momento de desemprego e dificuldade das empresas?
Amaury Rodrigues: Se a proposta era mudar a legislação para aumentar a
quantidade de empregos, talvez fosse melhor pensar na alteração da
legislação tributária, que onera a folha de pagamentos. Isso talvez
proporcionasse maior abertura de emprego que a própria mudança
trabalhista. Vieram algumas adequações da legislação que realmente
diminuíram o ônus do empresário, como a sucumbência. Se diminuiu o ônus
de uma contratação, eventualmente eu posso pensar em contratar em
situação que não contrataria. Não que a alteração da legislação por si
só cause aumento na quantidade de empregos oferecidos, mas reflexamente
isso poderia acontecer.
Valor: A análise econômica do direito, que ganha força no Judiciário, se aplica à Justiça do Trabalho?
Amaury Rodrigues: A análise econômica do direito é essencial em
qualquer ramo jurídico, incluindo o direito do trabalho. Ela faz sentido
na medida em que você vai avaliar a própria justiça das decisões e as
consequências jurídicas das decisões. O empresário deve pensar sob o
ângulo econômico da legislação do direito, mas principalmente os juízes,
ao sentenciarem, devem prestar atenção na consequência de suas
decisões. A análise econômica do direito é muito interessante porque se
determinada decisão causar um desequilíbrio na relação
empregado-empregador, vai repercutir nas atitudes futuras de empregados e
empregadores.
Valor: Dizem que alguns ministros do TST gostam de direito do trabalho e outros de direito da empresa? Vê essa diferença?
Amaury Rodrigues: Não. Já escutei várias pessoas dizendo que no direito
do trabalho só o empregado ganha. Não é verdade. E não deve ser
verdade. Ganha quem tem razão, independentemente de ser empregado ou ser
empregador. Por outro lado, também já ouvi que a Justiça está
excessivamente empresarial, que o empregado está desamparado e não deve
ser assim.
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