EMBRIAGUEZ NO TRABALHO - DOENÇA OU MOTIVO PARA JUSTA CAUSA?
Sergio Ferreira Pantaleão
A Consolidação das Leis do Trabalho - CLT prevê,
no artigo 482, alínea "f", a embriaguez (habitual ou em serviço) como
falta grave por parte do empregado, sendo este um dos motivos que
constitui a extinção do contrato de trabalho por justa causa.
Quando o legislador estabeleceu este como sendo um motivo para justa causa,
fundamentou-se na proteção do trabalhador que, trabalhando em estado de
embriaguez, poderia sofrer um prejuízo maior que a despedida motivada,
ou seja, um acidente grave que pudesse ocasionar a própria morte.
Não
obstante, este empregado poderia ainda provocar acidentes ou a morte de
outros colegas de trabalho, os quais estariam a mercê de uma atitude do
empregador para se evitar uma fatalidade.
A
embriaguez pode ser dividida em habitual (crônica) ou embriaguez "no
trabalho" (ocasional). Esta se dá necessariamente no ambiente de
trabalho e aquela, constitui um vício ou até mesmo uma enfermidade em
razão da reiteração do ato faltoso por parte do empregado, podendo
ocorrer tanto dentro quanto fora do ambiente da empresa.
A
embriaguez habitual tem sido vista jurisprudencialmente mais como
enfermidade do que como vício social, o que, perante a Justiça do
Trabalho, merece um tratamento e acompanhamento médico antes de se
extinguir o contrato por justa causa.
Quanto à embriaguez "no trabalho" ou ocasional, o
empregador, exercendo seu poder fiscalizador e de punição, poderá
adotar penas mais severas contra o empregado, em se verificando a falta
de interesse por parte deste na manutenção do contrato de trabalho.
Se a embriaguez habitual é tida pela jurisprudência como doença e não mais como motivo para justa causa, a CLT deveria ser reformada em seu artigo 482, alínea f, já que este tipo de demissão irá depender da comprovação desta habitualidade.
Será
então que o empregador poderia, havendo estes prejuízos materiais,
demitir o empregado por justa causa pelos danos causados e não pelo fato
da embriaguez?
Nesta hipótese, será que a justa causa ainda poderia ser revertida no tribunal pela falta de assistência ao empregado?
No
meio desta encruzilhada (lei x jurisprudência) está o empregador que,
usando seu poder diretivo, poderá demitir o empregado de imediato e
assumir o risco de ter revertida a justa causa, caso se comprove que a
embriaguez era crônica e não ocasional.
Diante
da incerteza, sensato seria à empresa incluir o empregado no programa
de recuperação de dependentes alcoólicos (caso a empresa tenha um
programa voltado a dependentes químicos) ou, como já mencionado
anteriormente, afastar o empregado e encaminhá-lo para o INSS, a fim de
que este tenha a oportunidade de se reabilitar antes de tomar uma decisão inadvertida.
A aplicação de advertência e suspensão disciplinar também são meios que o empregador pode se utilizar para tentar reverter o comportamento do empregado.
O entendimento dos tribunais, em
qualquer das situações de dependências químicas no ambiente de
trabalho, é de que cabe ao empregador esgotar os recursos disponíveis
para promover e preservar a saúde do trabalhador.
É
comum encontrarmos decisões em que a dispensa por justa causa com
fundamento na embriaguez é descaracterizada, condenando a empresa
reclamada no pagamento de verbas decorrentes de uma dispensa imotivada,
bem como estabelecendo a reintegração do empregado desligado, a fim de
que este possa fazer o devido tratamento.
Mas e se mesmo após um período de tratamento o empregado não se recuperar ou se depois do retorno da Previdência Social, voltar a se apresentar embriagado para o trabalho, poderia o empregador demitir por justa causa?
A empresa não é obrigada a manter o vínculo empregatício com
um empregado considerado capacitado para o trabalho, ou seja, é
prerrogativa da empresa demitir o empregado sem justa causa a qualquer
momento, desde que pague os direitos rescisórios decorrentes da dispensa
imotivada.
Entretanto,
em se tratando de casos de doença decorrentes de dependência química e
sob a ótica dos princípios constitucionais como a valorização do
trabalho humano, a função social do contrato, a dignidade da pessoa
humana entre outros que norteiam esta relação, da mesma forma que a
empresa se beneficiou da mão de obra deste empregado enquanto esteve
capacitado, prima-se pela tentativa de recuperar sua condição de saúde
antes de qualquer despedida arbitrária ou mesmo motivada.
Estas
são questões que parecem só resolver nos Tribunais e que dependerão de
provas concretas de ambas as partes. É prudente que o empregador se
cerque de provas de modo a demonstrar que se utilizou de todas as
medidas para a recuperação do empregado e a manutenção do contrato de trabalho,
daí a necessidade de todos os acompanhamentos médicos ocupacionais, que
poderão isentar o empregador de maiores responsabilidades.
Veja julgados sobre o assunto:
- Construtora Consegue Manutenção de Justa Causa de Pedreiro Encontrado Embriagado Durante Expediente
- Empregado Consegue Reverter Justa Causa Após Ser Dispensado Por Aparentar Embriaguez
- Empregado Embriagado Que se Envolveu em Acidente de Trânsito Tem Justa Causa Confirmada
- Família de Trabalhador Que Faleceu por Dirigir Embriagado não tem Direito a Indenização
- Não pode demitir por justa causa empregado que já havia recebido advertência e por apresentar embriaguez
- Alcoolismo crônico não é motivo para demissão por justa causa
Sergio Ferreira Pantaleão é Advogado, Administrador, responsável técnico pelo Guia Trabalhista e autor de obras na área trabalhista e Previdenciária.
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