Em clima tenso, STF julga prisão após 2ª instância
Em um debate que se estende por quase três décadas, o Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou na tarde de hoje o julgamento de ações que contestam a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância.
Essa autorização é considerada um dos pilares da Operação Lava Jato e pode abrir margem para a soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na véspera da sessão, o clima na Corte foi marcado por embate entre os ministros, com o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, pedindo “respeito” a Luís Roberto Barroso.
Além
de Lula, cerca de 4,8 mil presos podem ser beneficiados com uma mudança
de entendimento do Supremo sobre o tema, de acordo com o Conselho
Nacional de Justiça. De 2016 para cá, o STF já entendeu em quatro
ocasiões que é possível a prisão após condenação em segunda instância – a
última delas foi na análise de um habeas corpus do petista, que acabou
negado pelo apertado placar de 6 a 5. Faltava, no entanto, o julgamento
de mérito das três ações, formando o entendimento que deve ser aplicado
para todas as instâncias judiciais do País.
A discussão sobre o
artigo 5.º da Constituição, porém, começou muito antes, em 1991. Na
época, o tribunal entendeu por unanimidade que o princípio da presunção
de inocência não impedia a execução antecipada da pena, antes do
esgotamento de todos os recursos (o “trânsito em julgado”, em
juridiquês).
Isso mudou em 2009, quando o STF passou a permitir a
prisão apenas depois do esgotamento de todos os recursos. Em 2016, a
Corte voltou a admitir a medida, considerada fundamental por
procuradores e juízes na punição de criminosos do colarinho branco.
A sessão de hoje deve ser dominada por sustentações orais da Procuradoria-Geral da República (PGR), Advocacia-Geral da União (AGU),
de entidades e dos autores das três ações que pretendem barrar a
execução antecipada de pena – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados
do Brasil (OAB), Patriota e o PCdoB. O voto do relator, ministro Marco Aurélio Mello,
só deve ser lido na próxima quarta-feira, em sessão extraordinária
convocada para o período da manhã. Depois dele, se posicionarão os
outros 10 integrantes da Corte, em uma discussão que deve se estender
por ao menos três sessões plenárias.
Embate
Na
véspera do julgamento, houve embate entre ministros em duas ocasiões
distintas. Durante a análise de uma ação sobre prestação de contas de
partidos, Barroso questionou o posicionamento do ministro Alexandre de Moraes, que foi contra uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
que prevê a suspensão automática dos diretórios estaduais e municipais
que não apresentem as informações. Para Moraes, a norma do TSE usurpou
uma competência de legislar sobre o tema que seria do Congresso.
“Essa crença de que dinheiro público é dinheiro de ninguém é que
atrasa o País”, disse Barroso, ao interromper a leitura do voto do
colega. Moraes rebateu: “Essa crença de que o Supremo Tribunal Federal
pode fazer o que bem entende desrespeitando a legislação também atrasa o
país”.
Barroso observou então que a Constituição “diz
expressamente que há o dever de prestar contas”. “Eu acho que o dinheiro
público tem que ter contas prestadas”, afirmou Barroso. Foi nesse
momento em que Toffoli fez uma intervenção mais contundente: “Mas isso é
o que todos nós pensamos. Vossa Excelência respeite os colegas!”.
“Eu
sempre respeito os colegas. Eu estou emitindo minha opinião. Vossa
Excelência está sendo deselegante com um colega que é respeitoso com
todo mundo. Eu disse apenas que a Constituição impõe o dever de
prestação de contas”, retrucou Barroso.
Depois, em uma sessão
administrativa (que não é transmitida ao vivo pela TV Justiça, mas pode
ser acompanhada por jornalistas), houve novo atrito entre os ministros.
Foi a vez de o ministro Marco Aurélio Mello questionar a escolha de
Toffoli de contratar um escritório de arquitetura – sem licitação – para
elaborar o projeto do novo museu do Supremo, conforme revelou o Estado no
mês passado. “Deveria ser feita mediante licitação. Em segundo lugar, o
momento não é propício a esse gasto”, criticou Marco Aurélio. A
discussão não foi concluída.
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