Afinal, a Reforma da Previdência reduz privilégios ou arrocha os mais pobres?
Proposta para a previdência contribui ou atrapalha no combate à desigualdade? A resposta não é simples. Fotografia: Getty Images
A ida do ministro da Economia, Paulo Guedes, ao Congresso para
explicar a proposta de reforma da previdência acabou em confusão depois
que o deputado Zeca Dirceu (PT-PR) o acusou de ser “tchuthuca” com os
mais privilegiados e “tigrão” com os aposentados.
O ministro, que sustenta que a proposta do governo atinge
principalmente os grupos de maior renda, respondeu que “tchutchuca é a
sua mãe” e deixou a audiência.
Mas, afinal, a reforma almejada pelo governo de Jair Bolsonaro é
justa? Nessa reportagem a BBC News Brasil destrincha a proposta
mostrando que ela atinge todos os grupos – desde os mais pobres aos mais
privilegiados.
“Há alguns pontos na reforma que melhoram a desigualdade, outros que
são controversos e outros que claramente aumentam”, observa a economista
Vilma Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da
Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV).
A meta de Bolsonaro é economizar cerca de R$ 1,1 trilhão em dez anos
com a reforma. Em termos absolutos, o grosso recai sobre os
trabalhadores do setor privado, atendidos pelo INSS (R$ 687 bilhões). As
mudanças na aposentadoria dos servidores federais civis somam R$ 202
bilhões, enquanto o saldo líquido para os militares é de R$ 10 bilhões
(as mudanças na previdência estão atreladas a aumento de salários).
O restante (R$ 182 bilhões) vem de alterações no BPC (benefício para
idosos em extrema pobreza) e abono salarial (renda extra garantida a
trabalhadores que ganham até dois salários mínimos).
O ministério da Economia argumenta que a economia com os atendidos
pelo INSS é maior em termos absolutos porque esse grupo é numericamente
muito superior ao de militares e servidores. Já proporcionalmente,
calcula o governo, os grupos de maior renda estão contribuindo mais para
a economia.
Os cálculos do governo indicam que os 71 milhões que serão afetados
pelas mudanças em aposentadorias e pensões pagas pelo INSS perderão, em
média, R$ 9 mil em dez anos.
Já as mudanças propostas para os servidores públicos federais devem
atingir 1,4 milhão de pessoas, o que resultaria em perda média de R$ 141
mil.
No caso dos militares, o governo calculou apenas o impacto das
mudanças nas aposentadorias (que geram economia de R$ 97,3 bilhões em
dez anos) – isso representaria em média perda de R$ 181 mil para os 540
mil afetados.
Não entraram na conta os ganhos com a restruturação da carreira
prevista no pacote e que representa aumento de gastos de R$ 86,65
bilhões em uma década.
Obter o “tira-teima” do impacto da reforma não é simples. A reforma
que acaba de ser apresentada mexe em muitas regras, por isso, medir seu
efeito global sobre a distribuição de renda exige amplo estudo ainda não
realizado por economistas. No caso da proposta do governo Michel Temer,
por exemplo, uma análise do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea) chegou à conclusão que ela produziria “uma piora bem tímida” na
desigualdade, contrariando “visões excessivamente otimistas ou
pessimistas sobre os possíveis efeitos redistributivos da reforma”.
Para o consultor legislativo do Senado Pedro Nery, autor do livro
Reforma da Previdência – Por que o Brasil não Pode Esperar?, a proposta
de Bolsonaro é, de maneira geral, mais justa que a de Temer, pois
endurece mais as regras para os segmentos de maior renda (servidores
públicos, militares e trabalhadores do setor privado que se aposentam
com benefícios maiores pelo INSS).
Ele avalia também que a proposta enviada este ano para o Congresso é
mais branda que a de Temer quando altera as regras de auxílio para
idosos de baixa renda (BPC) e os critérios para aposentadoria rural e de
trabalhadores urbanos mais pobres.
Apesar disso, Nery reconhece que a proposta “não se resume a combate a
privilégios, como alega o governo”. E vê espaço para “regras ainda mais
duras para militares e servidores”.
Nessa reportagem, vamos analisar como a reforma afeta diferentes
grupos de renda em 4 pontos – idade mínima, cálculo dos benefícios,
alíquotas de contribuições e as mudanças de BPC e aposentadoria rural.
Mas, primeiro, damos um breve raio-x da desigualdade do rombo hoje.
Raio-x: ‘Fábrica de desigualdades’
O rombo da União com aposentadorias e pensões de servidores civis,
militares e setor privado (INSS) tem crescido rapidamente nos últimos
anos e somou R$ 266 bilhões no ano passado, segundo o ministério da
Economia.
Há uma grande diferença no valor dos benefícios. Segundo cálculo da
Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, a partir dos dados de
2016, o militar brasileiro tinha aposentadoria mensal média de R$ 10,3
mil, enquanto o servidor federal recebia R$ 9 mil. Já a aposentadoria
média paga pelo INSS era de R$ 1.290 no mesmo ano.
Dessa forma, os números absolutos mostram que o grosso do rombo vem
dos trabalhadores do setor privado: R$ 196 bilhões contra R$ 70 bilhões
de servidores federais e militares. Mas, do ponto de vista proporcional,
a maior parte do rombo vem do desequilíbrio no setor público.
Como a União usa recursos cobrados de todos com impostos para cobrir
esses deficits, na prática há uma transferência de renda de toda a
população para os aposentados do serviço público.
Ao expor os números, Guedes chamou a previdência de “fábrica de desigualdades”.
1) Idade mínima
Um dos fatores que explicam os crescentes rombos na previdência –
previsão de alta de 10% em 2019 para R$ 292 bilhões no caso da União – é
o envelhecimento da população, ou seja, mais pessoas se aposentando e
recebendo benefício por mais tempo.
Por causa disso, o governo quer uma idade mínima unificada para que
os trabalhadores civis se aposentem mais tarde, de 62 anos para mulheres
e 65 para homens, com ao menos 20 anos de contribuição.
Segundo Vilma Pinto, isso é positivo porque afetará principalmente os trabalhadores com salários maiores.
Atualmente, o trabalhador do setor privado pode se aposentar de duas
formas: cumprindo um tempo mínimo de contribuição (30 anos para mulheres
e 35 anos para homens); ou contribuindo por ao menos 15 anos e
alcançando uma idade mínima (60 anos para mulheres e 65 anos para
homens).
As estatísticas mostram que os trabalhadores de menor renda sofrem
mais com a instabilidade da economia, alternando períodos de desemprego,
trabalho informal e com carteira assinada.
Por isso, mesmo começando muito cedo a trabalhar, não conseguem
contribuir por 30 ou 35 anos. Já pessoas de maior renda têm mais
estabilidade profissional e se aposentam mais cedo, normalmente, por
tempo de contribuição.
Em média, quem se aposentou pelo INSS em dezembro por tempo de
contribuição tinha 54,2 anos e passou a receber R$ 2.366 por mês. Já o
benefício médio concedido aos que se aposentaram por idade ficou em R$
1.260.
E o serviço público?
A proposta de Bolsonaro é que a idade mínima de 62 anos para mulheres
e 65 para homens valha também para os servidores civis, com exigência
de ao menos 25 anos de contribuição.
A regra atual exige no mínimo 60 anos de idade e 35 anos de
contribuição para homens e 55 anos de idade e 30 anos de contribuição
para mulheres.
A queda no tempo mínimo de contribuição exigida não significa que a
regra foi afrouxada para o servidor, pois o valor da aposentadoria
ficará reduzido se ele não contribuir por mais tempo (entenda melhor no
item 2).
Já os militares terão seu tempo de contribuição mínimo elevado de 30
para 35 anos, mas não terão qualquer exigência de idade mínima. O
argumento do governo é que a carreira tem especificidades próprias.
“Este tema (da idade mínima) para nós que precisamos de rigidez
física para o combate, para atuação, para garantia da lei e da ordem em
todas as atividades que temos, é um tema importante”, disse em janeiro o
comandante da Marinha, Ilques Barbosa Junior, ao justificar a
diferença.
De acordo com dados levantados pelo Tribunal de Contas da União, 62%
dos integrantes das Forças Armadas passam para reserva com menos de 50
anos.
Ou seja, a unificação da idade mínima é justa no caso dos civis, pois
vai obrigar os trabalhadores de renda mais alta a se aposentarem em
idade semelhante a dos mais pobres hoje. Além disso, é positivo para as
contas do governo porque são benefícios mais altos que passarão a ser
pagos por menos tempo. Para ambos os grupos haverá um período de
transição das regras.
Já os militares continuarão parando de trabalhar mais cedo e com benefícios elevados (veja mais no item 2).
2. Tempo de contribuição e cálculo dos benefícios
Mais tempo trabalhando
A reforma traz também importantes mudanças no tempo de contribuição exigido.
No caso do INSS, o aumento do critério mínimo de 15 para 20 anos
prejudicará diretamente os mais pobres, em especial as mulheres, destaca
a economista Joana Mostafa, do Ipea.
Análise realizada por ela a partir de dados de 2014 mostra que 61%
dos que se aposentaram por idade não atingem 20 anos de contribuição. No
caso de mulheres, esse percentual sobe para 69%, refletindo a
interrupção da carreira por causa da maternidade ou sobrecarga no
trabalho doméstico.
“São justamente os trabalhadores de menor escolaridade, negros,
mulheres, que mais sofrem com rotatividade e desemprego. Eles já têm
dificuldade de contribuir por 15 anos, quem dirá por 20”, destaca
Mostafa.
Além do aumento do tempo mínimo, o governo também quer elevar o tempo
total de contribuição necessário para alcançar aposentadorias mais
altas, tanto no INSS, quanto no setor público (exceto militares).
A proposta é que o trabalhador que atingir 20 anos de contribuição
terá direito a apenas 60% a média dos seus salários como aposentadoria. A
cada ano extra de contribuição a taxa subiria em dois pontos
percentuais de modo que só será possível se aposentar com 100% da média
da remuneração ao longo da vida após 40 anos de contribuição.
Na avaliação de Joana Mostafa, dificultar o acesso a benefícios maiores é positivo.
“Quem pode contribuir mais é quem tem mais estabilidade no mercado de
trabalho, mais escolaridade, renda mais elevada. Se ele quer um
benefício maior, é justo que trabalhe mais”, afirma.
Vejamos a seguir como esse novo cálculo afeta os atendidos pelo INSS e o servidor público.
‘Achatamento’ dos benefícios no INSS afeta classe média
Os benefícios do INSS variam de um salário mínimo (hoje em R$ 998) a R$ 5,8 mil.
Pelas regras atuais, o benefício do aposentado no setor privado é
calculado com base na média dos 80% maiores salários. E o valor integral
desse cálculo (sem incidência do fator previdenciário) é garantido
quando a idade de aposentadoria e o tempo de contribuição somados dão 86
no caso das mulheres e 96 no caso dos homens.
Hoje, a grande maioria dos aposentados do INSS (85%) já ganha até
dois salários mínimos e o pagamento médio em 2018 ficou R$ 1.722 na
aposentadoria urbana.
A nova regra de cálculo vai dificultar mais alcançar benefícios maiores, aproximando mais a média das aposentadorias do piso.
São mudanças que afetam grupos intermediários na distribuição de
renda, ressalta Pedro Nery. “Um pequeno grupo de trabalhadores que
contribuiu por pouco tempo, mas sobre salários maiores, tem perdas com a
nova fórmula”, ressalta.
Joana Mostafa considera positivo o “achatamento” dos benefícios. Ela
ressalta que a renda média do trabalho no país é de apenas R$ 2.285
(dado do IBGE).
“Do meu ponto de vista, é melhor garantir uma renda de um salário
mínimo para o maior número de pessoas possíveis, e por isso não elevar o
tempo mínimo de contribuição para 20 anos, do que garantir um espectro
maior de benefício, que vá com maior facilidade até os R$ 5,8 mil”,
afirma.
Servidores também terão que trabalhar mais para ganhar mais
Ao analisar o impacto das mudanças sobre os servidores civis, é
importante destacar que eles não têm atualmente regras unificadas de
aposentadoria. Reformas adotadas em 2003 e 2013 já cortaram privilégios
desse grupo, mas, como elas só valeram para novos servidores, ainda não
impactam a maioria dos benefícios concedidos de lá para cá.
Os servidores contratados depois de 2003 perderam a integralidade
(direito a se aposentar pelo último salário, em vez da média de
contribuições). Já os que ingressaram após 2013 passaram a ficar
submetidos também ao teto do INSS (R$ 5,8 mil).
A proposta de Bolsonaro não acaba com a integralidade dos servidores
mais antigos, mas exige que ele trabalhe mais. Pela proposta, os que
entraram até 2003, por exemplo, terão que trabalhar até 62 anos
(mulheres) ou 65 anos (homens) para poder se aposentar pelo último
salário, em vez de 55 (mulheres) e 60 (homens) como é hoje.
Os que entraram no serviço público de 2004 a 2013 terão que trabalhar
40 anos para ter acesso a 100% da média dos salários ao longo da vida
(não mais a média dos 80% maiores), assim como os do INSS. A diferença é
que não estão submetidos ao teto de R$ 5,8 mil.
Os que entraram após 2013 já estão nas mesmas regras do setor privado e ficam também sujeitos ao novo cálculo e ao novo teto.
Prejuízo para todos
Em resumo, as mudanças propostas para tempo de contribuição e cálculo
dos valores prejudicam todos os grupos. Os mais pobres ao exigir 20
anos de contribuição em vez de 15. E os trabalhadores de renda
intermediária atendidos pelo INSS ao demandar mais tempo de trabalho
para alcançar benefícios maiores.
Os servidores também são afetados, mas a tendência é que continuem se
aposentando com valores mais altos do que os atendidos pelo INSS,
porque seus salários são em média maiores do que os do setor privado.
Além disso, eles têm mais estabilidade (não alternam períodos
desempregados e na informalidade), o que permite alcançar 40 anos de
contribuição com mais facilidade.
Para Pedro Nery, “a proposta é meritória por unificar o cálculo das
aposentadorias”, mas deveria prever um fim mais rápido para a
integralidade dos servidores mais antigos.
“É uma vantagem injustificável em termos de isonomia e diante do colapso fiscal dos Estados e capitais”, acredita.
Militares mantêm privilégio da integralidade
A proposta de Bolsonaro, capitão reformado do Exército, não prevê
qualquer alteração para o cálculo da aposentadoria – os militares
continuarão podendo se aposentar com o último salário recebido
(integralidade), em vez de a média da sua contribuição.
As Forças Armadas sustentam que o militar não se aposenta, na verdade
ele passa para a inatividade, continuando disponível a ser convocado (o
que na prática, porém, é muito raro). Também ressaltam que a carreira
não dá direitos que o civil recebe, como pagamento de horas extras,
possibilidade de greve e FGTS.
“Fazemos um juramento de sacrifício da própria vida”, argumentou
também Eduardo Garrido, assessor especial do ministro da Defesa, na
apresentação da proposta.
Para Pedro Nery, a reforma deveria ter regras mais rígidas para a integralidade.
“Aqueles que saem muito cedo, por necessidades da própria gestão da
carreira, poderiam se aposentar por um cálculo sobre a média dos soldos,
não sobre o último. Pela proposta, ainda teremos cerca de metade dos
militares podendo se aposentar antes dos 55, com o último soldo
integral”, disse.
3. Alíquotas: Quem ganha mais, paga mais
A proposta tem um aspecto que claramente afeta de forma positiva a
distribuição de renda – alíquotas de contribuição progressivas para o
setor privado e os servidores.
Atualmente, o funcionário público federal paga 11% sobre todo o
salário, caso tenha tomado posse antes de 2013. Quem ingressou no
serviço público depois de 2013 paga 11% até o teto do INSS, ou seja, não
contribui sobre o valor que supera R$ 5,8 mil.
Pelas novas regras, as alíquotas para os que ingressaram antes de
2013 serão proporcionais à remuneração, variando de 7,5% para o servidor
que recebe salário mínimo a 22% para quem recebe R$ 39 mil ou mais.
Como a cobrança é gradativa sobre o salário, porém, a alíquota máxima
efetiva ficaria em 16,78% – ou seja, o servidor com salário de 39 mil
pagaria R$ 6.544 ao mês em vez de R$ 4.290 como hoje.
A questão deve parar na Justiça – servidores dizem que uma alíquota
alta, somado ao que já pagam de imposto de renda, configuraria confisco.
Outro ponto polêmico é que a reforma também prevê a possibilidade de
alíquotas extraordinárias sobre os servidores se houver déficit atuarial
(insuficiência de recursos para cobrir os compromissos dos planos de
aposentadoria).
Segundo Nery, esse aumento ainda é insuficiente para equacionar o
rombo da previdência dos servidores (R$ 51 bilhões em 2018 no caso da
União): “A alíquota que equilibraria os regimes é superior a 22%”.
No setor privado, a proposta de Bolsonaro é tornar as alíquotas um
pouco mais progressivas, cobrando menos de quem ganha menos e mais de
quem ganha mais. Hoje variam de 8% a 11% no INSS. Com a reforma, iriam
de 7,5% a 14% (alíquota máxima efetiva de 11,69%). A proposta reduz a
cobrança da maioria dos trabalhadores que ganham até R$ 2 mil.
No caso dos militares, a alíquota não seria progressiva – subirá de 7,5% para 10,5%, independentemente da faixa salarial.
Ou seja, de modo geral as mudanças nas alíquotas tornam o sistema
mais justo, mas também contribuem pouco para reduzir o rombo da
previdência. Em dez anos, o ganho com a maior cobrança sobre servidores
vai gerar receita de R$ 29,3 bilhões, enquanto as mudanças nas alíquotas
do INSS criam perdas de R$ 27,6 bilhões.
4. BPC e Previdência Rural
As propostas para o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e a
aposentadoria rural atingem em cheio os mais pobres e sofrem resistência
no Congresso.
O BPC é um benefício de um salário mínimo pago a idosos em situação
de miséria e pode ser acessado hoje a partir de 65 anos. Pela proposta
do governo, apenas idosos a partir de 70 anos poderiam recebê-lo. Para
compensar essa mudança, a reforma prevê também um benefício de R$ 400
para idosos de 60 a 69 anos. Segundo a IFI, a mudança geraria economia
de R$ 28,7 bilhões em uma década.
O argumento para elevar a idade mínima para o BPC é que ela deve ser
maior do que a idade mínima para aposentadoria, para evitar que
trabalhadores deixem de contribuir para a previdência na perspectiva de
receber o BPC.
O problema, ressalta Nery, é que a reforma, ao aumentar o tempo
mínimo de contribuição de 15 para 20 anos, já dificultará aos mais
pobres conseguir se aposentar com 62 (mulheres) e 65 anos (homens).
“Esses trabalhadores perderiam essa aposentadoria e iriam para um BPC
enfraquecido”, nota ele.
Já o trabalhador rural hoje pode se aposentar aos 55 anos (para
mulheres) e 60 (para homens) – precisa comprovar 15 anos de trabalho,
mas não tem obrigação de contribuir. Como quase ninguém paga, o regime
teve rombo de R$ 114 bilhões em 2018.
A proposta fixa idade mínima de 60 anos para ambos os sexos e
contribuição mínima de 20 anos, baseada nos ganhos com a produção, mas
não menor que R$ 600 ao ano por grupo familiar.
Para Joana Mostafa, as mudanças vão dificultar a aposentadoria no
campo e “desorganizar a economia rural, essencial para nossa segurança
alimentar”. Os benefícios rurais são baixos (R$ 956 em média em 2018),
mas fazem diferença em cidades pequenas, do interior do país.
“Muito difícil essa contribuição mínima. Os preços da safra variam,
assim como é comum perder a produção por causa do clima, pragas”,
afirma.
O governo argumenta que há muitas fraudes na aposentadoria rural, já
que a exigência de comprovação de tempo de trabalho é facilmente
burlável. Segundo Paulo Guedes, a cobrança mínima proposta é simbólica e
dificultaria fraudes.
Apesar de o governo ter seu argumentos, as mudanças de fato impactam
muito os mais pobres – por isso, lideranças parlamentares já indicaram
sua rejeição.
E a recuperação da economia?
Defensores da reforma afirmam que ela vai contribuir para recuperar a
economia e, portanto, reduzir a pobreza no país. Dizem também que vai
liberar recursos do governo, hoje dragados pela expansão da previdência,
para gastos com obras, saúde, educação e programas sociais, que podem
melhorar a vida dos mais pobres.
Outros economistas já consideram que isso é “especulação”. Se de fato
os recursos seriam bem investidos ou direcionados para grupos já com
renda mais alta, por exemplo aumento para servidores ou isenções para
grandes empresas, é algo que só vamos saber depois – se a reforma
passar.
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