Acordos extrajudiciais e nova CLT são bons para quem?
A famigerada reforma trabalhista, materializada
por meio da lei 13.467/2017, tratou de vários temas, não somente envolvendo a
normatização das relações de trabalho, no campo individual, coletivo e sindical,
como também tratou de temas processuais, ou seja, relacionados ao funcionamento
da Justiça do Trabalho e ao andamento dos processos que nela tramitam. Não por
acaso, um projeto que começou com cerca de uma dezena de artigos, terminou com
uma lei que conta com uma centena de dispositivos.
Dentre os temas tratados, especificamente
envolvendo os aspectos processuais, para efeito do presente texto, dois merecem
destaque, até por guardarem uma relação íntima entre si. Ambos se relacionam com
a resolução de disputas pela via conciliatória e, ao mesmo tempo, exigem atenção
com a formação técnica na matéria, no sentido da aquisição da capacidade de
negociar acordos trabalhistas.
O primeiro aspecto a merecer consideração
consiste na criação de mecanismo denominado “jurisdição voluntária trabalhista”.
Tal solução, prevista no art. 855-B e seguintes da CLT, permite que acordos
firmados fora do Poder Judiciário sejam submetidos à homologação do juiz do
Trabalho. E com isso, tais acordos podem ganhar o status de imutabilidade,
assegurando que nada mais seja devido pelo ex-empregador ao empregado.
Obviamente que tal condição exige bastante cuidado e atenção, principalmente por
parte do juiz responsável pela homologação.
Outro tema importante consiste na quebra da
necessidade de que o preposto ou representante empresarial que comparece à
audiência na Justiça do Trabalho seja empregado da empresa. O Tribunal Superior
do Trabalho (TST) havia estabelecido na Súmula 377 que tal condição seria
indispensável.
Com a reforma trabalhista, que acrescentou o § 3º
no artigo 843 da CLT, não se faz mais necessário que o preposto seja empregado
da empresa. Na prática, surge então uma nova categoria: a do preposto
profissional. Uma figura que prestará o serviço de maneira concomitante para
várias empresas diferentes, sem ter vínculo com nenhuma.
E qual a relação entre os dois temas e a
resolução de disputas pela via da conciliação, bem como a necessidade de se
investir em formação técnica para negociar acordos trabalhistas?
Não obstante todas as críticas que se possam
fazer a tais alterações, inclusive no sentido de que seriam mais voltadas a
beneficiar as empresas em detrimento do interesse dos empregados, o fato é que
ambas implicam a ampliação dos espaços e possibilidades de busca de consensos
para a solução de conflitos trabalhista. E isso, naturalmente, exige toda
atenção e cuidado para que os referidos mecanismos não resultem em abusos,
lesões e prejuízos, principalmente à parte tida por mais fraca, ou seja, o
trabalhador.
No que tange a jurisdição voluntária, o fato é
que ela traz mais um ambiente para que as partes discutam uma solução de
consenso, a qual pode ganhar maior segurança e consistência, ao contar com
chancela judicial.
Da mesma maneira, com a possibilidade da
profissionalização do preposto, é possível que as empresas contem com pessoas
mais qualificadas para sentarem na mesa das salas de audiências, com o espírito
de construir acordos e soluções de consenso. Obviamente que isso pressupõe que
esse preposto seja qualificado para tanto. Isto é, que não se trate apenas de um
preposto de instrução, que saberia se portar diante de um interrogatório, mas
também de um preposto de conciliação, o qual saberia participar de uma
negociação em sala de audiência.
Essas mudanças podem ser consideradas como uma
forma de fomento aos meios de solução adequada de disputas, mais especificamente
envolvendo a conciliação, como alternativa para solução de conflitos
trabalhistas. No entanto, o grande desafio é criar condições para a construção e
negociação de soluções que possam gerar ganhos mútuos e sejam percebidas como
justas e satisfatórias. Isto sem contar a observância de parâmetros éticos,
principalmente no sentido de evitar fraudes e lesões, inclusive enquanto
condição de sobrevivência de tais mecanismos.
Para tanto, um caminho fundamental é investir em
formação técnica voltada à negociação. Somente dessa forma será possível firmar
acordos em que ambas as partes saiam ganhando. Existem várias construções na
área da negociação, principalmente envolvendo estratégias e técnicas de
negociação cooperativa, que podem promover o mencionado resultado. O importante
é o reforço da percepção de que uma solução justa e adequada é sempre
possível.
Porém, para isto uma condição é fundamental:
trata-se do domínio técnico do tema. A negociação não faz parte da cultura
acadêmica brasileira, principalmente dos cursos de Direito. Pouca atenção é dada
ao assunto no âmbito da formação corporativa. O brasileiro não descobriu ainda
os benefícios de uma negociação bem feita, onde todos os lados saem
satisfeitos.
No âmbito do Poder Judiciário trabalhista, a
conciliação antes do início do processo judicial é de grande valia. Na Semana
Nacional de Conciliação Trabalhista do Tribunal Superior do Trabalho (TST) deste
ano foram homologados 18218 acordos no valor de R$ 523,8 milhões. Ou seja, são
mais de 18 mil processos que não tramitarão mais na Justiça. A economia para os
cofres públicos é até difícil de calcular.
Portanto, o grande desafio, principalmente para
as empresas que pretendem se valer das novidades para a solução de conflitos
criadas pela reforma trabalhista, é contar com pessoas qualificadas para a
construção de consensos e negociações de acordo.
Com capacitação há ganhos mútuos, tanto para as
empresas quanto para os trabalhadores, e o mecanismo não falha.
(*) Rogerio Neiva Pinheiro é juiz do
Trabalho, juiz auxiliar da vice-presidência do TST, mestre em psicologia (UnB) e
especialista em negociação de conflitos trabalhista
João Vicente Murinelli Nebiker – Jurídico
Federação dos Empregados no Comércio de Bens e de Serviços do
Norte e do Nordeste – FECONESTE
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