Brasileiro poderá trabalhar 14 horas diárias sem receber horas extras
Reforma trabalhista permite que sindicatos e empregadores estendam a jornada de trabalhadores sem aumento da remuneração
Escrito por: Carta Capital/André Campos
A reforma trabalhista do governo Michel Temer pode
permitir que horas de trabalho antes remuneradas como horas extras
sejam incorporadas à jornada normal sem pagamento adicional. Atualmente,
todo empregado que faz hora extra tem direito a receber um adicional
de, no mínimo, 50% sobre o valor da hora normal.
Isso acontece porque a
proposta permite que sindicatos e empregadores negociem jornadas de até
220 horas mensais, mas não estabelece critérios claros para diferenciar o
que seria, dentro desse limite, horário regular ou trabalho
extraordinário.
“A intenção é justamente
permitir acordos coletivos com jornadas longas, de 10, 12 ou até 14
horas num dia, sem o pagamento de horas extras”, avalia Valdete Severo, juíza do Trabalho no Rio Grande do Sul.
Na ponta do lápis, o prejuízo ao trabalhador pode ser grande. Alguém
que ganha dois salários mínimos, 1.874 mil reais, pode perder cerca de
366,28 reais por mês – o equivalente a 20% da renda. Isso aconteceria no
caso desse funcionário trabalhar todas as 220 horas mensais previstas
na proposta, o que soma 2.640 horas ao ano. De acordo com as regras
atuais, ao menos 344 horas na jornada anual desse funcionário seriam horas extras.
Esta é, na verdade, uma
estimativa conservadora. As perdas do trabalhador seriam ainda maiores
se levássemos em conta os feriados e os casos de trabalho aos domingos,
quando as horas extras precisam ser pagas com 100% de acréscimo.
Outra mudança importante será
na remuneração por produtividade, que passa a ficar sujeita aos arranjos
feitos em acordos e convenções coletivas. O maior receio é que isso desobrigue empregadores a pagar o piso de categorias ou até mesmo o salário mínimo.
Para Jorge Ferreira dos Santos
Filho, coordenador da Articulação dos Empregados Rurais do Estado de
Minas Gerais, esses são problemas que já acontecem na prática no meio
rural, mas que são passíveis de punição pela justiça.
Um exemplo é a colheita do
café. Trabalhadores recebiam menos do que o salário mínimo em ao menos
metade de 30 cafezais inspecionados pelo Ministério Público do
Trabalho na região sul da Bahia entre maio e agosto de 2016.
Segundo o procurador Ilan
Fonseca, que coordenou as ações, a remuneração da lata – medida de
aproximadamente 60 litros onde os empregados colocam o café colhido –
gira em torno de dois a quatro reais, dependendo do local. “Muitos,
especialmente os mais idosos, não conseguem receber mais do que 500
reais ou 600 reais”, relatou o procurador.
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