A agenda sindical e trabalhista de 2017 Imprimir

Sob as retóricas de ‘melhorar o ambiente de negócios’ e de proporcionar ‘segurança jurídica’, o governo, por demanda do mercado, trouxe de volta a agenda do Consenso de Washington, abandonada em 2003, após a eleição de Lula à Presidência da República.
Marcos Verlaine*
Encaminhadas pelo governo Temer, as proposições de interesse do mercado em tramitação no Congresso Nacional têm o objetivo de retirar direitos dos trabalhadores e tornar o movimento sindical brasileiro irrelevante.
Não fosse a organização sindical dos trabalhadores brasileiros, por meio das centrais, confederações, federações, sindicatos e associações de trabalhadores, os direitos consignados na legislação trabalhista já teriam sido implodidos, tal como nos Estados Unidos. Lá diferente de aqui, os trabalhadores, segundo pesquisa de 2007, conduzida pelas universidades Harvard (EUA) e McGill (Canadá) aponta os EUA, dentre 173 nações membros da ONU, como um dos piores países do mundo em relação a direitos trabalhistas e políticas para a família, como licença-maternidade, auxílio-doença, férias e descanso semanal remunerados.
Nestes quesitos, os EUA, ainda segundo a pesquisa, se juntam a países como Libéria, Suazilândia, Papua-Nova Guiné e Lesoto.
Sob as retóricas de ‘melhorar o ambiente de negócios’ e de proporcionar ‘segurança jurídica’, o governo, por demanda do mercado trouxe de volta a agenda do Consenso de Washington, abandonada em 2003, após a eleição de Lula à Presidência da República.
A pauta em discussão no Congresso vai exigir luta estratégica dos movimentos sociais e sindical, que combine unidade de ação, com propostas alternativas consistentes em relação às reformas da Previdência e trabalhista.
É importante destacar que essas reformas não são unanimidade no Congresso. Pelo conteúdo radicalmente regressivo haverá muitas divergências na base do governo, que deverão ser exploradas à exaustão. Sobretudo porque estamos em ano pré-eleitoral e certamente deputados e senadores não irão querer comprometer seus projetos eleitorais e reeleitorais se posicionando à favor de propostas que reduzem e/ou retiram direitos dos trabalhadores, que são a maioria do eleitorado.

Agenda sindical e trabalhista
Veja o que vai movimentar o Congresso neste ano que se inicia. São basicamente cinco proposições em tramitação no Legislativo federal, sendo quatro projetos de lei e uma proposta de emenda à Constituição (PEC). Não são proposições quaisquer, pelo contrário.

As matérias alteram profundamente o Direito do Trabalho, ao ponto de comprometer sua aplicação nas relações de trabalho. E a proposta de alteração da Constituição Federal para, segundo o governo, preservar a Previdência Pública, mas que embute ou traz consigo a possibilidade de inviabilizar uma das principais fontes de distribuição de renda do País — a Previdência Social.
São três propostas em tramitação na Câmara dos Deputados e duas estão no Senado Federal:

Câmara dos Deputados
1) reforma trabalhista (PL 6.787/16);

2) reforma da Previdência (PEC 287/16); e
3) terceirização da mão de obra (PL 4.302/98). Este projeto foi resgatado pela bancada empresarial, a partir dos avanços alcançados no PLC 30/15 (PL 4.330/04), em discussão no Senado, sob a relatoria do senador Paulo Paim (PT-RS), que em seu substitutivo promoveu e manteve um texto de relativa razoabilidade para as relações de trabalho.

Senado Federal
1) terceirização da mão de obra (PLC 30/15); e

2) regulamentação do trabalho escravo (PLS 432/13).
Diante da gigantesca e monumental possibilidade de retrocessos incomensuráveis para a sociedade em geral e os trabalhadores em particular caberá ao movimento sindical atuar de forma firme e eficaz dentro e fora do Congresso para preservar direitos num quadro de correlação de forças muito adversas.
Será preciso conjugar a unidade de ação, com argúcia política para convencer os parlamentares que as propostas em debate promoverão, se aprovadas como se encontram, mais retrocessos sociais que avanços, como propala o governo. O quadro não é muito animador, mas será preciso explorar as contradições da base do governo, a fim de impedir que propostas tão danosas aos trabalhadores sejam ratificadas pelo Congresso sem que haja modificações substantivas nos textos.
Segue breve resumo das proposições, que deverão atrair as atenções do movimento sindical e dos trabalhadores e em relação às quais não poderá haver dispersão e incompreensão quanto aos efeitos nefastos que proporcionarão à sociedade se forem aprovadas no Legislativo.
DIREITO DO TRABALHADOR E PREVIDÊNCIA SOCIAL

CÂMARA DOS DEPUTADOS


1) REFORMA TRABALHISTA – PL 6.787/16
O Projeto de Lei 6.787/16, do Poder Executivo, apresentado em 23 de dezembro de 2016, tramita agora na Câmara dos Deputados em regime de prioridade, isto é, foi retirado o regime de urgência constitucional. Segundo o atual presidente da Câmara e candidato à reeleição, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a proposição deve ser aprovada na Casa no primeiro semestre de 2017.


A retirada da urgência constitucional é uma boa notícia, pois vai permitir uma discussão mais tranquila sobre a matéria nas comissões temáticas em que a proposta vai ser debatida.

Conteúdo e intenção
A finalidade deste projeto de lei é retirar direitos dos trabalhadores para baratear o custo da mão de obra no Brasil, que é uma das mais baratas do mundo. Além disso, as negociações, segundo o texto apresentado pelo governo Temer, que se sobrepõem a direitos garantidos por lei não precisarão ser feitas pelos sindicatos: podem ser feitas por representantes do conjunto de trabalhadores da empresa, o que torna ainda mais aguda a desigualdade da relação laboral e solapa a lógica da representação sindical.

Tramitação
O projeto aguarda despacho da Presidência da Câmara. O que será feito tão logo os trabalhos legislativos sejam retomados, a partir do dia 2 de fevereiro, com a eleição da nova Mesa Diretora da Casa. Pelas características do projeto irá passar inicialmente pela Comissão de Trabalho, que será a primeira comissão de mérito. Vai encerrar a tramitação nos colegiados temáticos na Comissão de Constituição e Justiça.

2) TERCEIRIZAÇÃO – PL 4.302/98
O projeto (PL 4.302/98) que permite a terceirização das atividades-fim, e não apenas limpeza, segurança e outras atividades-meio, como atualmente ocorre, já foi aprovado pela Câmara e modificado pelo Senado. E, agora, está na fase final de discussão na Câmara pronto para votação final no plenário. Essa proposta e o PL 6.787 são as maiores investidas da história contra o legado varguista, que instituiu um sistema de proteção aos trabalhadores no Brasil.

O PL 4.302 estava parado na Câmara, mas foi ressuscitado pela bancada patronal, a partir dos avanços obtidos em relação ao PLC 30/15. Na prática, este projeto resgata o texto do PL 4.330/04 para permitir a terceirização geral.
Para esta conjuntura, a indústria considera o PL 4.302 mais adequado no momento. “Ele melhora o ambiente e diminui a insegurança jurídica”, comentou o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga.

Tramitação
O projeto está pronto para votação no plenário da Câmara.


3) REFORMA DA PREVIDÊNCIA – PEC 287/16
O governo apresentou a proposta de reforma da Previdência (PEC 287/16) na qual o trabalhador precisará contribuir por 49 anos para assegurar o recebimento do teto do Regime Geral da Previdência Social, a cargo do INSS. A proposta estabelece paridade entre homens e mulheres e entre servidores públicos e trabalhadores da iniciativa privada. A PEC restringe o BPC (Benefício de Prestação Continuada). A aposentadoria sem contribuição para o trabalhador rural é extinta, assim como a aposentadoria especial de professores.

A agenda do secretário de Previdência Social do Ministério da Fazenda divulgada nas redes sociais mostra que ele se reuniu dezenas de vezes com empresas de Previdência privada, mas com sindicatos representativos dos trabalhadores, apenas no dia em que a proposta foi entregue ao Congresso. Os militares são os únicos poupados pela reforma. Eles, entretanto, são responsáveis por 48% do déficit da previdência, segundo estudo do consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados.
Em linhas gerais, a proposta em discussão na Câmara a PEC aprofunda as reformas de FHC e Lula e muda as regras previdenciárias em relação: 1) à idade mínima, 2) às regras de transição, 3) ao cálculo dos benefícios previdenciários, 4) aos requisitos entre homem e mulher para efeito de aposentadoria; 5) às aposentadorias especiais, 6) às pensões, 7) à aposentadoria por invalidez, 8) à acumulação de aposentadorias ou aposentadorias e pensões, 9) contribuição de inativo, e 10) à paridade e integralidade.

Tramitação
A proposta já foi admitida pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Assim que os trabalhos legislativos forem retomados, a partir do dia 2 de fevereiro, vai instalada a comissão especial que vai discutir o mérito da proposta.

A matéria será discutida no colegiado especial por 40 sessões ou cerca de 60 dias. Nas primeiras 10 sessões, o texto poderá receber emendas. Nessa fase de discussões serão realizadas audiências públicas para instrução da proposta.
SENADO FEDERAL

4) TERCEIRIZAÇÃO – PLC 30/15
O projeto, em discussão no Senado, obteve significativos avanços a partir do relatório do senador Paulo Paim (PT-RS). Por esta razão, a bancada empresarial perdeu interesse na matéria e ressuscitou o PL 4.302/98.

Numa linha de preservação de direitos, respeito e equilíbrio das relações de trabalho, o relator, senador Paim, trabalhou um relatório que contempla as principais demandas do movimento sindical neste tema.
Quais sejam: distinção entre atividade-meio e fim, relações solidárias x subsidiária, representação sindical, subcontratação ou quarteirização e pejotização. Então vejamos:
Atividade-meio e fim. No quesito atividade meio e fim, Paim, no seu relatório regulamenta a terceirização na atividade-meio e a proíbe na atividade-fim.
Relação solidária x subsidiária. Paim manteve o texto aprovado pela Câmara, que garante a relação solidária.
Representação sindical. Paim manteve o texto aprovado na Câmara. Isto é, garante isonomia de direitos entre o contratado diretamente e o terceirizado.
Subcontratação ou quarteirização. Pelo relatório de Paulo Paim fica proibida a subcontratação ou quarteirização, com ressalvas para o segmento da construção civil ou setores que possuem legislação específica sobre o assunto.
PJ (pejotização). Pelo relatório que vai à discussão, fica proibida a contração de pessoa física como se jurídica fosse. O texto aprovado pela Câmara permitiu isto, com quarentena. Isto é, o empregador poderia demitir o trabalhador e dois anos depois contratá-lo como pessoa jurídica (pejotização).

Tramitação
O projeto está pronto para votação no plenário do Senado.


5) TRABALHO ESCRAVO – PLS 432/13
Em 2014 foi aprovada a Emenda Constitucional 81, que determina expropriação de áreas nas quais for utilizado trabalho escravo. A emenda precisa ser regulamentada por lei para ser efetivada. Entretanto, a nova regulamentação proposta é um retrocesso, pois inviabiliza a atuação exercida atualmente pelos fiscais do Ministério Público do Trabalho no combate a essa prática.

A regulamentação do trabalho escravo, contido no PLS 432/13, dispõe sobre a expropriação das propriedades rurais e urbanas onde se localizem a exploração de trabalho escravo.
Estabelece que o mero descumprimento da legislação trabalhista não caracteriza trabalho escravo.
Determina que todo e qualquer bem de valor econômico — apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou da exploração de trabalho escravo — seja confiscado e revertido ao Fundo Especial de Prevenção e Combate ao Trabalho Escravo e ao Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Drogas Afins (Funprestie).
E estabelece que os imóveis rurais e urbanos, que devido às suas especificidades não forem passíveis de destinação à reforma agrária e a programas de habitação popular, poderão ser vendidos e os recursos decorrentes da venda deverão ser remetidos ao Funprestie.
Determina que nas hipóteses de exploração de trabalho em propriedades pertencentes à União, estados, Distrito Federal ou municípios, ou em propriedades pertencentes às empresas públicas ou à sociedade de economia mista, a responsabilidade penal será atribuída ao respectivo gestor.
Estabelece que a ação expropriatória de imóveis rurais e urbanos em que forem localizadas a exploração de trabalho escravo observará a lei processual civil, bem como a necessidade de trânsito em julgado de sentença penal condenatória contra o proprietário que explorar diretamente o trabalho escravo.

Tramitação
Aguarda parecer do relator, senador Paulo Paim (PT-RS), na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.


(*) Jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap

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