Estiagem perfeita' aprofunda crise no Agreste pernambucano
Localizado na região com maior déficit hídrico do Brasil, o polo de confecções do Agreste de Pernambuco vive o drama da "estiagem perfeita": uma combinação amarga entre crise econômica e seca prolongada. No último ano, cerca de 20% dos empregos formais - 5,6 mil vagas - foram extintos, quando as lavanderias de jeans reduziram seus quadros drasticamente ou fecharam as portas. Se 2017 se confirmar como o sexto ano de seca consecutiva da região, a previsão dos empresários é de uma nova onda demissões.
Ao lado das cidades de Caruaru e Santa Cruz do Capibaribe, a 172 km do Recife, Toritama é uma das três mais importantes cidades do polo de confecções pernambucano, que reúne 18,8 mil micro e pequenas empresas em dez municípios e deve faturar esse ano cerca de R$ 5,2 bilhões.
O que sustenta o município de Toritama é a confecção de peças em jeans, segmento que mais tem sofrido com a seca na região. No processo de lavagem, onde o jeans é amaciado e recebe efeitos de cor e textura, o consumo de água por peça chega a ser 70 litros. Só que desde abril o sistema da abastecimento de água estadual, feito pela Compesa, não chega a Toritama. Todos os açudes e reservatórios das proximidades estão secos e o que pouco sobrou de água está a mais de 100 km de distância da cidade.
A solução para as casas e as empresas são os carros-pipa, uma alternativa cada vez mais cara para as a confecções. "Essa seca veio para ensinar aquilo que não sabíamos sobre corte de custos. Ou seja, tudo", diz o empresário José Bezerra, dono da Lavanderia Bezerra. "A última crise grave assim por aqui foi nos anos 90. Quem sobreviver a essa crise vai ter muita história para contar".
No último ano, o custo do empresário com água triplicou, as vendas caíram pela metade, ele demitiu 12 dos 82 funcionários e reduziu de três para dois o número de turnos na fábrica. O mudança mais drástica pode vir no início do ano que vem, se nada mudar em relação à água. "É possível que eu paralise metade da produção, alternando grupos de trabalho", diz.
Como atua no nicho popular, as empresas do polo de confecções não conseguem repassar para os preços a alta de custos. Os clientes têm a opção de comprar dos polos de confecção do Sudeste do país ou buscar produtos asiáticos. A equação não fecha, principalmente nas empresas menores. Leonardo Bezerra, optou por fechar as portas da lavanderia Leronny, demitindo 23 pessoas. "Fiz isso há um ano, prevendo que a situação agora estaria pior. E acertei", conta o empresário, que reduziu ainda de 28 para 16 o número de pessoas na sua confecção.
Os hotéis e restaurantes da região estão com dificuldades de oferecer água para os clientes compradores que chegam ao local, conta Fred Maia, presidente do Núcleo Gestor da Cadeia Têxtil e de Confecções de Pernambuco. "Sem a água, a coisa mais simples se torna complicada."
De acordo com Maia, o volume de peças produzido pelo polo de confecções do Agreste deve recuar em cerca de 30 milhões, de 5%, este ano. Em relação ao auge de produção da região, alcançado no ano de 2014, o recuo é de 15%. O volume produzido só não cai mais porque trabalhadores continuam na ativa, mas sem carteira assinada. Segundo Maia, o polo de confecções do Agreste emprega 130 mil pessoas informalmente.
Nos fundos da lavanderia Mamute, uma das mais tradicionais da região, o rio Capibaribe, que corta o Estado, se resume no momento a algumas pequenas poças de água, de onde desesperadamente as empresas ainda tentam tirar água com bombas. O resto do cenário são grandes pedra e solo rachado.
Como a maioria das empresas da região, a Mamute reaproveita água da lavagem com a adição de produtos químicos. Mas água de reúso apenas minimiza o problema dos custos. O dono da Mamute, o empresário Edilson Tavares, que se elegeu prefeito de Toritama nas últimas eleições, conta que precisou reduzir seu quadro de funcionários em 40%, restando agora apenas 48 pessoas na empresa.
A situação de abastecimento do Agreste de Pernambuco é pior do que no Sertão, porque a densidade populacional da região é superior. A região não dispõe de rios perenes, o solo não é propício para poços e praticamente não há barragens com capacidade de enfrentar longas secas.
A solução em caráter definitivo para o problema passa pela transposição das águas do rio São Francisco, uma obra federal que só deve ser concluída no segundo semestre de 2017, e pela Adutora do Agreste, obra estadual com recursos federais, que levará água do canal da transposição à região. Até agora, apenas 45% da Adutora do Agreste foi executada desde 2013. Do orçamento inicial de R$ 1,38 bilhão, já foram repassados para o governo do Estado R$ 569 milhões.
A obra da adutora passou os últimos 30 meses em ritmo muito lento, por conta da queda dos repasses do governo. Nos primeiros seis meses deste ano, foram transferidos apenas R$ 30 milhões. No segundo semestre, até agora, foram mais R$ 70 milhões. Para ser concluída em 2018, a obra precisaria receber R$ 350 milhões em 2017.
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