Empresas flexibilizam horários por mobilidade
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Como ficou claro nos dias de jogos do Brasil durante a Copa
do Mundo, o fluxo intenso de pessoas se locomovendo em um horário
específico é um dos principais problemas nas grandes cidades. A situação
piora em regiões com alta concentração de prédios comerciais e
escritórios e, em razão disso, mais empresas têm adotado políticas
relacionadas à mobilidade.
Uma solução inicial tem sido a semiflexibilização do expediente,
que permite ao funcionário ter mais autonomia sobre a própria rotina
sem que a companhia perca controle dos horários de seus profissionais.
De mudança marcada para uma nova sede em São Paulo,
o grupo segurador BB e Mapfre decidiu por esse caminho. A empresa, que
hoje tem uma sede com 800 empregados na avenida Engenheiro Luís Carlos
Berrini - região campeã de reclamações quando o assunto é mobilidade -,
vai se mudar em junho do ano que vem para um edifício no bairro do
Morumbi. Lá, vai receber profissionais de outros prédios e, assim,
concentrar cerca de 2.000 pessoas. "A mudança nos fez questionar várias
coisas, mas foi uma dificuldade que gerou muitas possibilidades", diz
Cynthia Betti, diretora de RH.
Em março deste ano, a empresa passou a permitir que um grupo "piloto"
de 190 pessoas escolhesse um horário de entrada entre 7h e 11h. Uma vez
decidido, o horário é adotado em todos os dias da semana, com exceção de quando há rodízio do carro.
A decisão é tomada pelo funcionário com o chefe direto, que assim pode
organizar a rotina da equipe. "Ao desenhar os programas, conversamos com
os executivos para sentir quais áreas estavam mais prontas para a
prática", diz Cynthia. A área comercial, por exemplo, já possui um
horário próprio, pois atua boa parte do tempo fora do escritório.
Já o RH foi o último a escolher seus horários, para que o atendimento
ao resto da empresa não fosse comprometido. A intenção agora é abrir a
possibilidade para todos os funcionários do prédio.
A prática funciona como a primeira fase de um processo de políticas de mobilidade que busca "olhar mais para dentro de casa". Segundo Cynthia, o próximo passo é instituir um regime
misto de trabalho remoto. Como o novo prédio do BB e Mapfre terá menos
vagas de estacionamento disponíveis, a empresa também fez uma parceria
com o site de caronas Caronetas, estuda a possibilidade de ter ônibus
fretados junto com outras empresas e está mapeando o percurso dos
funcionários para facilitar que eles se organizem em caronas - aqueles
que usarem o carro para transportar mais pessoas terão acesso a uma vaga no novo prédio.
Para Andrea Leal, consultora de políticas públicas do Banco Mundial e
do World Resources Institute (WRI), o interesse das empresas por
práticas que facilitem a mobilidade corporativa vem crescendo de forma
significativa. "Elas percebem que os funcionários estão cansados e que
se interessam muito por essas alternativas", diz. Além disso, trata-se
também de uma oportunidade de cortar custos - ao retirar a ajuda para
estacionamento do pacote de benefícios -, de reduzir o estresse e
adicionar o impacto positivo nas emissões de gases como mais um item nos
seus relatórios de sustentabilidade.
Flexibilizar o horário de entrada é uma das formas de facilitar, em
especial, a adoção do transporte público. Um levantamento feito pelo
Banco Mundial com 377 funcionários de empresas da região da Berrini
revelou que 28% dos que gostariam de trocar o carro por transporte
público o fariam se tivessem a possibilidade de entrar e sair em
horários que fugissem do "rush" nos ônibus, trens e metrôs. "Uma das
grandes reclamações é que o transporte público é muito cheio em horários
de pico", diz.
Outra ação que diminuiu bastante o número de profissionais que vão de
carro ao trabalho foi o pagamento integral do vale-transporte pela
empresa, bem como a oferta de fretados sem desconto no salário.
Organizado pelo Banco Mundial, um projeto piloto de mobilidade urbana
teve a participação de dez empresas da Berrini e terminou em setembro do
ano passado com a diminuição, em média, de cinco pontos percentuais do
número de carros
usados. Aquelas que adotaram mais práticas e incentivos, no entanto,
viram redução de até 20 pontos percentuais no número de funcionários que
dirigem até o trabalho.
Um novo projeto, agora capitaneado pelo WRI, é o Plataforma Conexões do
Rio Pinheiros, em fase inicial, com cerca de 20 empresas. O Banco
Santander, que em 2011 se mudou para uma torre onde circulam diariamente
cinco mil profissionais na Marginal Pinheiros, participa do projeto
como exemplo mais completo de práticas de mobilidade, segundo Andrea.
"Havia um mito, quando nos mudamos para o atual edifício, que ia demorar
40 minutos para sair da garagem", diz Edmar Coletti, superintendente de
projetos, serviços e atendimento do banco. Uma série de práticas para
evitar esse cenário foi adotada, a começar
pelo expediente flexível similar ao do BB e Mapfre. "Ajuda muito não só
com o trânsito, mas também na logística do elevador e dos
restaurantes", diz Coletti.
Ele considera que, ainda mais eficaz nesse sentido, foi a decisão de
tornar o prédio o mais "conveniente" possível. Na torre, foram
instaladas academia, salão de beleza,
centro médico com consultas em horários alternativos e cinco
restaurantes, além de lojas itinerantes, como um comércio de chocolate
na época da Páscoa. Ao não cobrar o aluguel das lojas, o banco consegue
que os produtos e serviços tenham preço menor. Ele estima que por volta
de mil pessoas fiquem no local até mais tarde diariamente nessas
atividades.
A empresa também tem linhas de ônibus fretados, bicicletário com
vestiário e sistema de carona "amiga", que destina cerca de 500 vagas,
das 1.800 do prédio, àqueles que se cadastram como motoristas de grupos
de funcionários. A ação mais recente foi disponibilizar 30 vagas
rotativas para carros
de fora do banco que passam diariamente para dar carona aos empregados,
além da instalação de mais salas de videoconferência, que diminuíram o
número diário de corridas de táxi de 600 para 150. "Todas essas práticas
se somam e ajudam a desafogar a rua", diz.
A indústria química Dow adota a prática de semiflexibilização desde
2008. Os cerca de 900 profissionais podem chegar à sede da empresa, em
São Paulo, a partir das 7h, também após acordo com o chefe direto e o
resto da equipe. A companhia adota ainda práticas como o trabalho remoto
em um dia da semana e a "short friday", que permite que o empregado
saia da empresa mais cedo no último dia útil da semana. "Deixar de se
preocupar com o trânsito e melhorar o equilíbrio entre a vida pessoal e a
profissional são formas de ser mais produtivo", afirma a diretora de
recursos humanos, Susannah Thomas.
Dar liberdade para que os funcionários possam escolher a hora de chegar
ao trabalho não é uma medida exclusiva de grandes empresas. Na
Companhia de Idiomas, com apenas 20 funcionários na sede administrativa,
em São Paulo, a prática já existe há mais de dez anos. A sócia-diretora
Rosângela Souza diz que o principal critério para os profissionais
decidirem o horário de entrada entre 6h45, quando a empresa abre, até as
10h, é o trânsito - independentemente de uso de carro ou transporte
público. Quase todos preferem chegar perto das 7h ou depois das 10h.
"Qualidade de vida é você escolher o que fazer com o seu tempo", diz.
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